segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

NÃO ME PROMETO PROMESSAS




Clichê...tudo se transformou em clichê...Que o ano que vem seja diferente, que no ano que vem eu comece aquela dieta, que no ano que vem eu faça uma viagem etc... Prometer a si mesmo é tão cruel quanto fazer uma promessa a alguém que você sabe de antemão que não poderá cumprir. Então resolvi...não me farei nenhuma promessa.
Não me culparei pelos meus erros deste ano e não ousarei dizer que não tornarei a cometer os mesmos erros.
Não cairei na armadilha de acreditar que o ano termina e nasce outra vez, os anos se entrelaçam, seguem, é sucessivo, progressivo, ainda que haja a impressão de regressão em algum período.
Continuar...sim, a única promessa é esta...Vou continuar tentando me ouvir, vou continuar o que comecei desde quando adquiri consciência, quero o meu lugar no planeta, continuar é a minha sina.
O tempo não para, e não foi Cazuza que me ensinou por meio da canção, foi com o meu coração em pedaços que entendi a roda viva que é a vida, ela não para que eu me refaça, ela não é piedosa, embora possa ser irresistível quando quero...Então por que perder tempo tentando encontrar respostas? Por que formular questões tão complexas?
Sem muitas palavras hoje...Prometo ser infiel a mim mesma, prometo me propor enigmas e não ousarei decifrá-los...


                                                                                                                


quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

FECHANDO OS OLHOS




Ás vezes ressaltar o que é ruim se torna uma síndrome, sim, muitas vezes me percebo considerando mais o que de ruim acontece do que ao contrário. Simples, isso se deve ao fato de que mais coisas ruins costumam acontecer, e ás vezes sonhar com o que é bom parece acolher frustrações à medida que não é realizado.
Eu tenho um lugar particular e alheio a tudo que de ruim acontece, um lugar só meu, um retiro calmo e silencioso, uma paixão revigorante e em constante ebulição...eu amo escrever, e é delicioso poder ser livre em mim mesma, as palavras me dão essa certeza, certeza de quem eu sou, eu sou o que escrevo.
Engraçado a forma com a qual as palavras me incomodam, de repente estou pensando e elas começam a se compor dentro de mim, se alinhar na minha mente, não há ordem, não há como impedir que sejam abortadas dos meus pensamentos e  do meu coração...e então me ponho a escrever.

ACORDANDO DENTRO DE MIM         
De todos os livros que eu li neste ano, o que mais me marcou foi o livro “O Olho da Rua” de Eliane Brum, e uma das coisas que Eliane cita é a importância de um olhar sem preconceitos, a importância de se esvaziar e perceber a realidade pelo olhar do outro, e percebi que não se tratava apenas de algo crucial para um jornalista, é crucial para ser gente.
As histórias reais me despertaram para dentro de mim mesma, me vi sem algemas, com igualdades, medos, dores, limitações, mas também me despertei para me aceitar, entender que algumas circunstâncias não poderão ser mudadas por mim, e isso não é covardia, nem tudo pode ser mudado.
Diversas vezes já julguei e diversas vezes me senti paralisada por julgamentos, já fui mesquinha algumas vezes e já me envergonhei por isso logo em seguida. Me senti humana, nem mais, nem menos, mas humana, vi nas diversas narrativas do livro em alguns momentos a minha própria imagem.
Me imaginei em um asilo, me imaginei em um leito, me imaginei na Brasilândia, me vi entre as mães que perderam seus filhos para as drogas e o crime, me vi entre os nus, sim, eram pessoas despidas, de alma à mostra, pessoas que precisavam dizer algo, ou diziam sem perceber que precisavam dizer.
Entendo que erros e acertos caminham tão juntos, que discernir se chama viver. Aí por um momento não me contive em ser passional, não me julguei por ser carne viva, não me limitei, eu não farei mais isso comigo, deixarei para que outros o façam, terei compaixão de mim mesma e da minha humanidade.
E agora tenho uma grande aspiração na vida: ser gente, me enxergar como igual, não sou diferente de nenhuma das pessoas com as quais tive contato por meio do livro e nem das demais por meio da vida, mas além de ser igual é importante enxergar com o olhar do outro, sem preconceitos, sem reservas.

                                                                       








terça-feira, 18 de dezembro de 2012

AS MENTIRAS EM QUE SE DEVE ACREDITAR


Refletindo sobre minha própria vida, percebi que desde que adquiri consciência quando criança fui persuadida a acreditar em mentiras, mas mentiras necessárias.
As mentiras clássicas infantis, as histórias onde no final tudo termina bem, onde todos os conflitos cooperam para que o casal jovem e adorável fique junto e tenha um final feliz, onde se acredita que depois que eles se casam, nada, absolutamente nada vai se opor à felicidade deles novamente. E são essas belas histórias com toda essa atmosfera lúdica e benevolente, que contribuem para que os sonhos tenham um alicerce.
Sim, eu acreditei nisso por toda a minha infância, depois percebi que no mundo em que vivo existe uma licença poética muito mais abrangente do que simplesmente alterações em histórias literárias, uma licença poética chamada realidade, dura demais muitas vezes e talvez mentirosa na maior parte.
A mentira não foi apenas o sapo que virava príncipe ou que príncipes existissem, mas também o bom velhinho que presenteava no final do ano aqueles que tinham se comportado e o que dizer de tantos que se comportavam bem nos becos, favelas e ruas e não ganhavam presentes? E se os coelhos entregavam ovos de chocolate, por que os supermercados os vendiam?
Ah mentiras! Quantas e infindáveis mentiras fizeram parte da minha vida e quantas ainda fazem! Quantas vezes “acreditei” mesmo sabendo que não era verdade, por que se realmente desacreditasse haveria brusco pesar. Quantas vezes disse não, querendo dizer sim ou o contrário, e quantas vezes omiti escondendo por trás desta prudência algo chamado... mentira? Sim!
Quantos sonhos construídos sobre a poeira da vaidade e sobre a crença no que se considera importante acreditar.
Percebo que as mentiras nas quais acreditei não impediram a edificação dos meus sonhos e a construção dos meus valores, não profanaram a verdade, aliás, foram sempre transparentes demais ao longo da vida.
São mentiras inexoráveis da existência humana, mentiras verdadeiras demais para serem consideradas mentiras, afinal todos sempre souberam em algum momento que não era verdade, e não saberiam caminhar se não encontrassem abrigo em suas infindáveis e opcionais promessas.

                                                         
                                                     

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

ENCONTRO INESQUECÍVEL


Depois de voar horas e horas pelo Universo, Vespúcio teve uma ideia:
 E se eu finalmente caminhasse sobre o planeta Terra e desse só uma espiadinha?  levantou dos anéis de Saturno, onde estava sentado para descansar, e voando em questão de segundos chegou à superfície do planeta Terra, o planeta que particularmente para ele, era o mais enigmático e interessante. Vespúcio caminhava com curiosidade e finalmente se inclinou, sem que ele percebesse um meteoro lhe atingiu e mesmo sabendo voar, se desequilibrou e caiu. Ele não fez força para voar, a sensação de embriaguez por estar em um planeta tão diferente do seu, o dominou. Os diversos odores lhe penetravam nas entranhas e pouco antes que caísse em terra firme, vomitou líquido lilás fluorescente.
 Sentado em sua cadeira de cortiça com seu violão, o homem coberto de vômito era o engraçado Ramalhão:
  Eita meu sinhô, que pássaro doido foi esse que cagou?
Apenas de cueca e botas de cangaço, Ramalhão se dirigiu à beira do rio:
 Eita meu sinhô, que ômi misterioso é esse aqui nesse sertão?  Ramalhão com seus olhos naturalmente esbugalhados via o homem com seus olhos triangulares e disse:
 Ômi do céu, carnaval já passou cabra, e tu vomita bem em cima do meu violão? Eita cachaça nociva da moléstia!  Vespúcio se levantou intimidado, mas não sentia nada de ruim pelo terráqueo engraçado que lhe falava:
 Me desculpe senhor terráqueo, é que eu estava apenas observando o seu planeta, quando um meteoro me surpreendeu e eu caí, o cheiro do seu planeta embrulhou o meu estômago e eu vomitei  Ramalhão surpreendeu o extraterrestre com a naturalidade com a qual lhe respondeu:
 Não se aporrinhe ômi, essas coisa aconteci, mas intaum cê é um ET?  Ramalhão o fitava com doçura enquanto Vespúcio o respondia:
 Eu sou da zona sul do planeta Plutão, eu achava que todos os terráqueos fossem iguais  disse encantado.
 Ixi ômi, cê tá doido? Sou igual esse povo doido não  dizia Ramalhão com seu sotaque carregado, seus olhos arregalados e seu jeito engraçado  Qué qui tu pensa do povo daqui?
 Ah terráqueo, as pouquíssimas vezes em que me inclinei para observar o seu planeta, vi coisas assustadoras, homens se matando, muito líquido vermelho escorrendo, homens pegando objetos que não são deles, e muitas vezes pegando objetos com violência de outros homens, vi também muitos objetos de nome arma, e em muitos lugares pessoas choram, gritam ou não acordam nunca mais.
 Ixi ômi, tu viu foi a realidade desse lugar, aconteci muita coisa assim aqui, mas aqui nesse sertão com esse violão véio que só, eu vivo sozinho e tento num pensá no que aconteci por aí — dizia Ramalhão compassivamente ao extraterrestre cada vez mais impressionado  E qual seu nome caro ômi de Plutão?
 Me chamo Vespúcio e você?
 Eu sou Ramalhão, meu nome é João Ramalho, mas mi chamam pelo apelido, tu chame tamém visse?
 Nossa Ramalhão, você é tão diferente do que eu imaginava  dizia Vespúcio com seriedade e admiração.
 Eita ômi, vivo aqui só, tenho minha viola, como das coisa que a minha terrinha dá, trabaio com artesanato, vou pra cidadi uma veis na semana, fico o dia todinho tentano vendê, mas minha vida é isso aqui, simples que só, sou feliz assim.
 Puxa vida Ramalhão! Que grande ironia, no meu planeta eu também convivo com a solidão, gosto de ficar na minha cratera na zona sul da terra azul e sem leis, trabalho como assistente antissocial, ajudo os seres do meu planeta, mas não me sinto bem convivendo em grupo, prefiro andar pelo Universo e admirar os planetas, gosto de ficar sozinho.
 Eita ômi que beleza e cêis lá vive como? Come o quê?
 Ramalhão lá não precisamos de alimento como aqui e também não há a necessidade de dinheiro.
 Oxi, ah que beleza! Assim que eu queria vivê ômi  dizia Ramalhão com semblante sonhador.
 Não achava que poderia ser tão semelhante a um terráqueo!
Ramalhão e Vespúcio conversavam sobre muitas coisas e as curiosidades não cessavam. Os dias passavam e Vespúcio abrigado no pobre barraco de Ramalhão, parecia tristonho:
 Ramalhão, eu preciso voltar para Plutão, foi muito enriquecedor encontrá-lo e conviver aqui neste sertão, mas sinto falta do meu planeta, das estrelas, da lua, de sentar nos anéis de Saturno, de observar os planetas da superfície.
 Oxi ômi, fique mais um pouco, num é sempre que um cabra legal assim aparece nesse sertão de meu Deus  dizia com sua voz inconfundível e fala devagar.
 Você tem razão Ramalhão, estou realizando um sonho, que era ficar um tempo em outro planeta e conhecer um terráqueo, ficarei mais uns dias por aqui  dizia Vespúcio enchendo de alegria o coração de Ramalhão.
 Ixi, meu coração não guenta não ômi, bora conversar mais, bora.
Muitos dias se passaram, Vespúcio se dividia entre a amizade do terráqueo e a saudade do seu planeta, até que um dia o inevitável aconteceu:
 Ramalhão, eu não queria, mas ao mesmo tempo você sabe... sinto saudade do meu planeta, do Universo, da minha vida por lá  os olhos triangulares marejados deixavam escorrer lágrimas fluorescentes.
 Sei disso ômi, num é fácil mesmo não, mas saiba ocê, que mesmo longe em outro planeta, a amizade continua visse?  Ramalhão dizia com olhos também lacrimejantes, porém com seu jeito excêntrico e humor inconfundível.
Anoiteceu, e após um longo abraço, Vespúcio voou numa velocidade imperceptível aos olhos do maluco Ramalhão.
E até hoje quando está sentado em sua velha cadeira com sua antiga viola, Ramalhão lembra com carinho do seu amigo extraterrestre. E Vespúcio quando caminha sobre o planeta Terra, lembra com carinho do amigo Ramalhão, e é como se ouvisse:
 Ômi do céu!